Coerente com convicções, Tabata Amaral vive rotina de agressões e ameaças

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Em seu primeiro mandato como deputada federal, Tabata Amaral já experimentou situações de extremo constrangimento. Na reforma da Previdência, ela contrariou a orientação do seu então partido, o PDT, e votou a favor das mudanças que permitiram ajustar um sistema que caminhava para o colapso — e foi massacrada nas redes sociais pela militância de esquerda. Antes disso, Tabata também já havia entrado na lista negra dos bolsonaristas ao travar um duro embate com o então ministro da Educação, Ricardo Vélez, a quem acusou de despreparo e incapacidade para exercer o cargo. O massacre nas redes sociais, dessa vez, foi promovido pela militância da direita radical. O volume e a dimensão das ameaças contra a parlamentar chegaram a ponto de ela ser orientada a circular em carro blindado e com proteção policial. Mas nenhuma agressão foi tão explícita, grosseira e também simbólica como a que aconteceu no último fim de semana.

Em uma mensagem disparada para seus mais de 470 000 seguidores, o ator José de Abreu xingou Tabata de “canalha”. Não satisfeito, ele ainda compartilhou a postagem de um cidadão que ameaçava socar a congressista caso a encontrasse na rua. Tudo porque a deputada deu uma entrevista criticando a polarização entre petistas e bolsonaristas. Diante da má repercussão nas redes, José de Abreu tentou explicar que reproduzir o texto não significava endosso à ameaça, mas o estrago já estava feito. O episódio também revelou que a indignação de alguns setores da sociedade diante de agressões dessa natureza é, para dizer o mínimo, bastante seletiva. Na terça-feira 21, durante um depoimento na CPI da Pandemia, a senadora Simone Tebet (MDB-­MS) foi chamada de “descontrolada” pelo ministro Wagner Rosário, controlador-geral da União. A reação das parlamentares da bancada feminina — corretíssima, diga-se — foi implacável. No caso de Tabata, predominou o silêncio cúmplice. Procurados, o PDT, que tem o presidenciável Ciro Gomes como estrela principal e suspendeu a deputada de seus quadros após a reforma da Previdência, e o PT, partido a que José de Abreu se filiou em 2013, nem sequer comentaram o caso.

Tabata Amaral, que tem apenas 27 anos, integra hoje um grupo de alvos que redes sociais como o Facebook consideram permeáveis a agressões mais violentas. Menções criminosas a ela são reunidas periodicamente por uma equipe da plataforma. O time de assessores da parlamentar também compila diariamente as postagens com ataques e encaminha o material para a polícia. O monitoramento detectou certo padrão nas mensagens intimidatórias: elas são majoritariamente publicadas em perfis no Twitter e incentivam agressões e espancamentos, como a que foi retuitada por José de Abreu. Os ataques via redes sociais ganham envergadura sempre que Tabata se posiciona contra pautas simpáticas a Jair Bolsonaro, como a flexibilização do disparo de fake news e a adoção do voto impresso, ou a favor em votações de temas sensíveis à esquerda, como a reforma da Previdência e o projeto de autonomia do Banco Central.

VALENTÃO - José de Abreu: no Twitter, o ator petista chamou a deputada de “canalha” e reproduziu mensagem com ameaças de agressão –@josedeabreu/Instagram

Na terça-feira 21, a deputada se filiou ao PSB. Na solenidade, em Brasília, o destempero de José de Abreu até permeou rodas de conversa entre os convidados, mas não foi enfrentado abertamente pela cúpula do partido. Nos discursos de boas-vindas de caciques como Carlos Siqueira, presidente da legenda, e Márcio França, coordenador da sigla em São Paulo, o caso foi ignorado. É uma passividade tática. O PSB, afinal, tende a apoiar o PT de José de Abreu nas eleições presidenciais do ano que vem e não quer criar rusgas que possam comprometer uma futura parceria. O silêncio conivente — e conveniente — foi quebrado apenas pela secretária nacional de Mulheres do PSB Dora Pires, que criticou a inação de seus correligionários. “Até agora a gente não se uniu para fazer uma defesa decente da Tabata”, protestou. Em entrevista a VEJA, Tabata falou sobre o episódio: “Fico triste em ver pessoas que se apresentam como feministas, que dizem lutar contra o machismo, contra a violência política e de gênero, se calarem completamente, ou porque não gostam de mim, ou porque gostam do Zé de Abreu. Isso é muita hipocrisia. O combate ao machismo deve ser firme, independente de quem seja o alvo”. Em tempo: Tabata é incentivadora de uma candidatura da chamada terceira via e, por causa disso, contra o alinhamento automático de seu partido a Lula e ao PT. Para ela, Jair Bolsonaro é o adversário principal a ser batido em 2022. Apoiar Lula, só em último caso.

No dia da filiação ao PSB, o prefeito do Recife, João Campos, namorado da congressista, destacou que Tabata Amaral “nunca pensou em desistir” da vida pública. Não é bem assim. Quando os ataques contra ela atingiram níveis considerados absurdos e perigosos — cartas com ameaças de morte, mensagens com sugestões de estupro e a invasão de e-mail de familiares —, ela confidenciou a apoiadores que cogitou renunciar ao mandato e deixar Brasília para trás. Hoje diz ter aprendido a lidar com as intimidações: “Descobri que a vida pública não é uma Disneylândia” — e não é mesmo, embora algumas celebridades insistam em interpretar na vida real personagens da Disney, como Gaston, o valentão machista, preconceituoso e inculto do filme a Bela e a Fera.

Colaborou Victor Irajá

Publicado em VEJA de 29 de setembro de 2021, edição nº 2757

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