Refugiado no Brasil, haitiano celebra o primeiro Dia dos Pais após nascimento do filho: 'Ele é um milagre'

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Badio Stanley chegou ao país em 2016, recrutado por projeto em Resende que dá oportunidades através do futebol. Cinco anos depois, ele formou uma família e virou papai de primeira viagem. Badio Stanley com o filho, Gael, e a esposa, Jéssica Guiraldi
Badio Stanley Saint Nosier/Arquivo Pessoal
Ao deixar o Haiti e desembarcar no Brasil, Badio Stanley Saint Nosier trouxe na mala a esperança de uma vida melhor, que planejava traçar através do futebol. Passados cerca de cinco anos, ele comemora neste domingo (8) o primeiro Dia dos Pais após o nascimento de seu filho, Gael Dieudonne. Um momento muito especial para o haitiano e a esposa Jéssica Guiraldi.
“Para mim e minha mulher, esse filho é um milagre. Ele representa muito, muito mesmo para a gente”, resume Badio.
“Quando o meu filho nasceu, senti algo que eu nunca tinha sentido antes, uma emoção muito grande naquele momento. Uma sensação que só quem é pai pode sentir”, relembra.
Badio veio para o Brasil em 2016. Quando saiu de Porto Príncipe, capital do Haiti, tinha ainda de 16 para 17 anos.
Apaixonado por futebol, ele veio para o país após ser recrutado pelo Pérolas Negras, clube de Resende (RJ), que oferece oportunidades para refugiados de diferentes nacionalidades através do esporte.
Na cidade do Sul do estado do Rio, Badio se estabeleceu e formou uma família ao lado de Jéssica, que é brasileira. Os dois se conheceram em 2019 através das redes sociais. Dois anos depois, o filho Gael veio ao mundo, em janeiro, como fruto do relacionamento do casal.
Badio Stanley com Gael no colo. Ele comemora seu primeiro Dia dos Pais após o nascimento do filho
Badio Stanley Saint Nosier/Arquivo Pessoal
Quando pôde pegá-lo no colo pela primeira vez, os braços de Badio foram um porto seguro para seu “pequeno príncipe”. Mas isso demorou um pouco para acontecer. O haitiano conta que Gael nasceu com um problema de saúde descoberto ainda durante a gestação. Por conta disso, ele não pôde ter contato diretamente com o filho nos primeiros meses.
“Não consegui pegar ele no colo quando nasceu. Eu estava treinando e me mandaram uma mensagem, que o parto iria acontecer naquele dia. Naquele momento, peguei o ônibus. Aí, me mandaram mensagem e uma foto dele, mostrando que tinha nascido. Na verdade, eu fui ver ele só depois de um dia, porque ficou doente. E só depois de uns três meses fui pegar ele no colo”, recorda Badio.
“Ele teve uma malformação da cabeça, descoberta no sétimo mês de gestação. Desde então, é cirurgia atrás de cirurgia. Ficou hospitalizado e saiu depois de seis meses de vida. Ele é um guerreiro, porque desde que nasceu luta contra esse problema”, explica.
Dia dos Pais à distância
Badio Stanley lamenta que não vai poder estar com o filho no domingo, Dia dos Pais. Por conta da saúde, o filho precisou ficar em São Paulo junto com a mãe, Jéssica, para dar sequência ao tratamento.
Já o jogador, vai estar em Resende, defendendo o Pérolas Negras, que disputa a Copa Rio e a Série B1, terceira divisão do futebol carioca. Mas isso não significa que eles não irão se ver. Para driblar a saudade e encurtar a distância, a tecnologia entra em campo.
“Estarei trabalhando. Estamos em época de campeonato e minha família está longe. Eles ainda não podem estar perto de mim, porque meu filho ainda está em recuperação, acabou de sair do hospital e minha mulher ficou em São Paulo para poder ir às consultas com ele. A gente vai matar a saudade por vídeo mesmo”, explica o jogador.
Papais de primeira viagem
Badio Stanley com o filho Gael e a esposa Jéssica Guiraldi
Badio Stanley Saint Nosier/Arquivo Pessoal
O primeiro nome, Gael, foi escolhido por Jéssica. Já o segundo, Dieudonne, foi uma escolha de Badio, em homenagem ao irmão do jogador, que morreu em 2017 e era muito querido pelo haitiano.
Gael Dieudonne é o primogênito do casal. Algo que pode deixar os papais de primeira viagem inseguros e apreensivos a respeito da responsabilidade de educar uma criança.
Badio admite que ficou reflexivo após o nascimento e que também tem sido um processo de amadurecimento para ele, que hoje está com 21 anos.
“Posso dizer que ser pai pela primeira vez deixa você muito pensativo, se perguntando: ‘será que vai dar conta?’. Principalmente, para mim que sou jovem, a preocupação é grande se a gente vai ser realmente um bom pai. Mas estou me dedicando muito. De qualquer forma, é algo muito bom”, conta.
Apesar do frio na barriga, a esposa Jéssica afirma que o marido tem batido um bolão na hora de vestir a camisa do “papai futebol clube”. Nas palavras dela, “Badio é um pai amoroso, corajoso, companheiro, cuidadoso e dedicado”.
“Eu e ele somos pais de primeira viagem, e de um guerreiro. Gael é o milagre de Deus em nossa vida. E, nessa caminhada, ele [Badio] tem me surpreendido diariamente, em todos os aspectos, não só como pai, mas como esposo também. Tem exercido sua paternidade de uma forma que me deixa ainda mais apaixonada por ele. Olhar ele com Gael no colo me traz a sensação de gratidão, pois Deus me abençoou com dois meninos lindos, fortes e corajosos”, elogia Jéssica.
Histórias para contar ao filho
Badio Stanley quando ainda estava no Haiti
Rafael Novaes/Arquivo pessoal
A vida de Badio tem sido de muita luta desde que deixou o Haiti e veio para o Brasil, através das portas abertas pelo Pérolas Negras há cinco anos. Apesar das dificuldades, a longa caminhada também o levou lugares de destaque e ele voltou com boas histórias na bagagem para poder contar para o filho.
Em 2019, o haitiano foi personagem de uma reportagem do Caldeirão do Huck em homenagem ao Dia dos Refugiados (20 de junho). Na ocasião, o programa promoveu o emocionante reencontro de Badio e sua mãe.
Badio com a mãe no programa ‘Caldeirão do Huck’, que promoveu o reencontro dos dois
Reprodução/TV Globo
Quando saiu de sua terra natal, em 2016, ele deixou para trás uma realidade de violência e pobreza, num país que foi duramente afetado por um forte terremoto em 2010. Mas também deixou o restante da família e amigos. Felizmente, Badio pôde reencontrar a mãe, que hoje vive com ele no Brasil.
— Foi uma grande oportunidade pra mim, mas foi bem difícil pra minha mãe. Até hoje, eu sinto falta da minha família de lá e dos amigos. Essa chance que eu tenho no Pérolas Negras representa muita coisa pra mim, principalmente a alegria que colocou no coração da minha família, essa chance de poder jogar futebol, em busca do meu sonho – descreveu na época.
A jornada não parou por aí. Também em 2019, o haitiano viajou para a Europa a convite da Organização das Nações Unidas. Ele e mais quatro companheiros de Pérolas Negras, refugiados de outros países, participaram de um campeonato como parte da programação do Fórum Global de Refugiados, da ONU. O evento aconteceu em Genebra, na Suíça.
Já em 2021, o haitiano foi campeão da Série B2 com o Pérolas Negras, que conquistou o acesso para a divisão de cima. É desta forma que Badio Satanley segue acumulando vitórias dentro e fora de campo. Histórias que certamente serão passadas de pai para filho.
“Não vejo a hora de o Gael crescer para que eu possa ensinar a ele tudo que o pai sabe”, conclui Badio.
Badio Stanley, ao fundo, comemora título da Série B2 do Carioca com o Pérolas Negras
Marcos Faria
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